Portugal está cercado por um espesso nevoeiro populista. E esta neblina demagógica costuma ser descrita por um eufemismo mui simpático: 'a gratuitidade da saúde'. Sucede que a santidade da 'saúde grátis' está a afundar o país. Nós não vivemos no país das maravilhas do dr. António Arnaut. Nós vivemos na realidade. E na realidade, essa galdéria reacionária, não há médicos grátis. Quando recusa qualquer mudança no statu quo do Serviço Nacional de Saúde (SNS), o dr. Arnaut está a incorrer no populismo mais rasteirinho. Aliás, quando diz que as mudanças propostas pelo PSD são um regresso ao Estado Novo, o populismo medicinal do dr. Arnaut alcança mesmo a medalha de ouro da demagogia socialista.
Enquanto berra contra o neoliberalismo, que afinal é regresso ao fascismo, o dr. Arnaut evita o confronto com a realidade. Eu, como sou um pouco mais novo, não me posso dar a esse luxo. Tenho mesmo de olhar para a aspereza dos factos: perante a evolução da medicina e ante o aumento da esperança média de vida, o atual SNS é insustentável. Isto é uma questão de facto. Não é uma questão de opinião. Os custos da saúde já ultrapassam os 10% do PIB. Ora, este número conduz-me às perguntas que causam brotoeja no ouvidinho do dr. Arnaut: o SNS já consome todo o nosso IRS? Se nada for feito, o SNS vai consumir o IRS e o IRC em 2020? Ou seja, a minha geração vai ser atirada para as galés do SNS? Eu e os meus filhos estamos destinados a ser os remadores do dr. Arnaut? O nosso futuro é a escravatura fiscal?
Não há como fugir ao assunto: os portugueses têm de pagar mais pelos serviços de saúde prestados pelo Estado. Contra esta conta mui simples (não é física quântica), o dr. Arnaut responde com um mui progressista "estou indignado". O dr. Arnaut julga que a indignação é um argumento. Lamento, mas V. Exa. tem de fazer melhor. E eu, alma piedosa, estou disposto a ajudá-lo. Até porque não é muito difícil encontrar argumentos racionais para a sua causa. Quando se cruza a realidade económica e demográfica com a sua inflexibilidade ideológica, quer-me parecer que V.Exa. só tem duas propostas para apresentar: ou começamos a comer velhinhas ao pequeno-almoço, ou colocamos o Estado no negócio do narcotráfico. A segunda opção parece-me mais realista, e gastronomicamente mais aceitável. Porque o tráfico, meu caro amigo, é a único negócio capaz de alimentar as necessidades hiperbólicas do SNS, tal como ele está. Eis, portanto, a solução para o socialismo do século XXI: o Estado social através do narco-estado. Nesta utopia narcotizada, os hospitais seriam sustentados pela cocaína elitista, e os centros de saúde seriam alimentados pelo charro pensativo. 'Fuma um charro e salva o SNS', eis o slogan para o seu socialismo, caro dr. Arnaut.