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sexta-feira, 22 de setembro de 2006

Desemprego: estatísticas com alma 



Sempre considerei perfeitamente redutora a expressão «Os desempregados não querem trabalhar». Tal como a noção de que preferem «receber um subsídio a procurar outro emprego». Que é, geralmente, pronunciada por quem não se encontra nesse estado. Antes de qualquer outra coisa, um estado de necessidade. Quem o profere estará, de qualquer forma, protegido do flagelo. Daí os erros na apreciação. Como se o não querer fosse a causa objectiva para a condição de desempregado. Ora, nada de mais errado.

Há muito que se passou em Portugal o limiar do que os economistas chamam desemprego estrutural. Que é um nível de desemprego existente numa situação de pleno-emprego. Juízo, aparentemente, contraditório. Que advém da noção de que haverá sempre quem, querendo, acabe por não entrar no mercado de trabalho. Por diversas razões. A principal, a absolescência da mão-obra face às novas tecnologias empregues nos processos produtivos.

Portugal regista, actualmente, cerca de 480 mil desempregados. Pelos registos, oficiais, do Instituto de Emprego e Formação Profissional. Há quem fale, no entanto, em mais cerca de metade destes números. Não registados. Por motivos vários. Entre os quais, certamente, o de não acreditarem nas benesses do próprio registo. Fora do limite do tempo que dá direito a subsídio. Porque o Estado nunca teve vocação para arranjar empregos. Fora do próprio Estado, obviamente. Onde tudo já terá sido tomado. 200 mil em excesso, dizem os do Compromisso Portugal. E isto sem contar com a grande Família Autárquica. Que tem tendência para ver no auto-emprego a principal conquista do Poder Local. Que trata muitas vezes como um exclusivo feudo seu. Cosa Nostra.

Desconheço a composição da fileira de desempregados em Portugal. Uso o senso comum para fazer apreciações. Quem despede são as empresas. Que usam, geralmente, as suas próprias ferramentas de racionalidade. O Estado, como é sabido, tem vocação contrária. Ora, as empresas despedem quando os negócios correm mal. Do que culpam a conjuntura internacional, na ocasião pouco propícia ao tecido empresarial nacional. Dos tradicionais têxteis, vestuário e calçado. Até aos menos tradicionais, dos componentes automóveis até às telecomunicações. Uns e outros, ainda muito intensivos em mão-de-obra. Que está agora mais barata noutros locais. Também o comércio e os serviços. Sectores muito sensíveis às mudanças de humor dos consumidores. Os de cá e os de lá de fora. Cujo mau humor dura já há alguns anos. Seguidos.

Parto do princípio de que estes desempregados serão mais qualificados do que no passado. A sua grande maioria não será já, seguramente, operária. Nem do Vale do Ave. A quem restaria «trabalhar na horta do quintal» para superar a crise. Na célebre explicação de Mário Soares, em versão de primeiro-ministro. Creio, pois, na sua maior qualificação geral, por provirem dos sectores da nossa economia mais expostos à concorrência. Muitas vezes externa. E que poderão ter melhores qualificações do que muitos dos que estão empregados.

Não deixa de ser curiosa, entretanto, a incorporação de cerca de 40 mil licenciados nestes números. Não, certamente, todos pré-professores de áreas humanísticas. As quais, curiosamente, continuam a exigir um simples «10» para a licenciatura. Num sinal de que o Estado continua a não saber gerir os seus recursos. Quando se compara com o deficit nas quotas, por exemplo, para os cursos de medicina. Os licenciados desempregados serão, inclusivè, a única classe que cresce todos os anos. Abastecidos pelas faculdades, convertidas em fornecedores de contingentes de novos desempregados. Aos que se juntarão agora, pasme-se, cerca de uma centena de professores universitários. Tudo isto no País com os maiores níveis de iliteracia da União Europeia.

Este nível de desemprego, que creio crescente no futuro, ocorrerá por muitas e variadas razões. Por desinvestimento das empresas. Por deficiências na formação de mão-de-obra. Pela má utilização de fundos para formação e reconversão. Pelos efeitos da globalização. Pela retracção do investimento directo estrangeiro. Pela alteração nos padrões de competitividade internacional. Os especialistas, designadamente em estatísticas, o dirão. Para mim, este será sempre um fenómeno merecedor de todo o respeito. Por todas as razões. A maior das quais, como já ouvi alguém dizer, porque «Um homem com fome, é sempre um homem com fome, não é estatística!»



«Considera o que se diz e não te preocupes de saber quem o disse» (Tomás de Kempis, Imitação de Cristo, Capítulo 5, nº1

Anónimo,   às  20:25

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